Médico consegue adiar o serviço militar para poder realizar curso de Residência Médica
AÇÃO ORDINÁRIA (PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO) Nº 5010624-26.2014.404.7100/RS
AUTOR
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RODRIGO SCHROEDER CANOVA
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ADVOGADO
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MAURÍCIO MICHAELSEN
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RÉU
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UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
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SENTENÇA
Vistos, etc.
Trata-se de Ação Ordinária proposta por RODRIGO SCHROEDER CANOVA, objetivando, em antecipação de tutela, o adiamento do Estágio de Adaptação e Serviço (EAS), até a finalização do Curso de Residência Médica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e para que reste suspensa, também, a obrigatoriedade de apresentar-se na data de 06 de março de 2014 para a incorporação.
Narrou que antes de ingressar no curso de Medicina foi dispensado do serviço militar por excesso de contingente e após a conclusão do curso foi convocado nos moldes da Lei n° 12.336/10, o que fez com que ingressasse em juízo postulando ser desobrigado da prestação do serviço militar, no entanto, a sentença lhe foi desfavorável.
Relatou que participou do certame para seleção de residentes na área de Anestesiologia junto ao HCPA - Hospital de Clínicas de Porto Alegre, classificando-se em segundo lugar. Requereu e teve negado o adiamento da sua convocação. Arguiu o autor que lhe assiste o direito ao adiamento, conforme prevê o artigo 29 da lei 4.375/64, com redação da Lei 12.336/2010. Requereu AJG. Juntou documentos.
Deferidos o pedido de antecipação de tutela e o benefício da Assistência Judiciária Gratuita (evento 3).
Citada, a União contestou (evento 15). No mérito, disse, em síntese, que o ato de convocação do autor foi praticado em consonância com a Lei n° 5.292/67 e que a Administração agiu dentro da legalidade, não podendo o ato ser anulado. Alegou que médicos, farmacêuticos, dentistas e veterinários devem ser convocados após a conclusão de seus estudos. Defendeu a aplicação da Lei n° 12.336, de 26 de outubro de 2010. Pediu a improcedência da demanda.
Intimado, o autor apresentou réplica (evento 18).
Vieram os autos conclusos para sentença.
É o relatório.
Decido.
Postula a parte autora o adiamento do Estágio de Adaptação e Serviço (EAS), até o final do Curso de Residência Médica do Hospital de Clínica, bem como a obrigatoriedade de apresentar-se na data de 06 de março de 2014 para a incorporação.
Ao analisar o pedido de antecipação de tutela, assim me manifestei:
Inicialmente, em consulta ao sistema de processo eletrônico, verifico que o autor distribuiu, perante o juízo federal da 5ª Vara Federal de Porto Alegre, em 21/01/2013, o Processo n° 5002570-08.2013.404.7100, tendo por objeto a sua dispensa do serviço militar obrigatório, sendo que o feito teve sentença de improcedência, tudo em conformidade com o relato do autor.
Vê-se, ainda, que o demandante obteve medida liminar conformada em sentença para fins de adiamento da incorporação em razão de encontrar-se cursando Especialização em Saúde da Família junto a Coordenadoria de Educação Aberta e a Distância /PREG da Universidade Federal de Pelotas como bolsista junto ao PROVAB. O processo tramitou na 5ª Vara Federal sob nº 5020775-85.2013.404.7100.
Quanto à primeira demanda, entendo que as causas de pedir e pedidos são totalmente distintos (eis que a presente visa o adiamento de sua incorporação por estar cursando Residência Médica).
Com relação à segunda, ainda que se trate também de adiamento da incorporação, teve como motivação a frequência em curso distinto da Residência Médica, portanto, não vislumbro a possibilidade de litispendência, razão pela qual passo a analisar o pleito antecipatório.
Para a concessão de antecipação de tutela, exige o art. 273 do CPC a presença de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, ou o manifesto propósito protelatório do réu, bem como a verossimilhança da alegação, a ser fundamentada em prova inequívoca. Evidentemente, tal expressão não pode ser compreendida como uma demonstração definitiva dos fatos - somente atingível após uma cognição exauriente -, mas sim como uma prova robusta, suficiente para evidenciar a matéria fática posta em causa e provocar a formação de um juízo de probabilidade da pretensão esboçada na inicial.
A Lei nº 12.336/10 alterou as normas que regiam a prestação do serviço militar pelos estudantes, ou formados, nos cursos de medicina, Odontologia, Veterinária e Farmácia. Para melhor compreensão, transcrevo abaixo os termos da nova lei:
Art. 1º Os arts. 17, 29, 30 e 75 da Lei no 4.375, de 17 de agosto de 1964, passam a vigorar com a seguinte redação:
'Art. 17. .....................................................................
§ 1º Os brasileiros das classes anteriores ainda em débito com o serviço militar, bem como os médicos, farmacêuticos, dentistas e veterinários possuidores de Certificado de Dispensa de Incorporação, sujeitam-se às mesmas obrigações impostas aos da classe convocada, sem prejuízo das sanções que lhes forem aplicáveis na forma desta Lei e de seu regulamento.
...
'Art. 30. ......................................................................
§ 6º Aqueles que tiverem sido dispensados da incorporação e concluírem os cursos em IEs destinados à formação de médicos, farmacêuticos, dentistas e veterinários poderão ser convocados para a prestação do serviço militar.
Art. 2º A Lei no 4.375, de 1964, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 40-A:
'Art. 40-A. O Certificado de Isenção e o Certificado de Dispensa de Incorporação dos brasileiros concluintes dos cursos de medicina, Farmácia, Odontologia e Veterinária terão validade até a diplomação e deverão ser revalidados pela região militar competente para ratificar a dispensa ou recolhidos, no caso de incorporação, a depender da necessidade das Forças Armadas.'
Desta sorte, o autor estaria, ao término do curso de Medicina, obrigado a prestar o serviço militar. Contudo, o art. 4° da Lei n° 5.292/67 foi alterado pela Lei n° 12.336/10, passando a ter o seguinte teor:
Art. 4o Os concluintes dos cursos nos IEs destinados à formação de médicos, farmacêuticos, dentistas e veterinários que não tenham prestado o serviço militar inicial obrigatório no momento da convocação de sua classe, por adiamento ou dispensa de incorporação, deverão prestar o serviço militar no ano seguinte ao da conclusão do respectivo curso ou após a realização de programa de residência médica ou pós-graduação, na forma estabelecida pelo caput e pela alínea 'a' do parágrafo único do art. 3o, obedecidas as demais condições fixadas nesta Lei e em sua regulamentação.
A Lei 12.336 alterou também o art. 29 da Lei 4.375/64, ao prever o direito ao adiamento da incorporação àqueles que estiverem matriculados em cursos tais como aquele que o demandante pretende frequentar.
Art 29. Poderão ter a incorporação adiada:
(...) e) os que estiverem matriculados ou que se candidatarem à matrícula em institutos de ensino (IEs) destinados à formação, residência médica ou pós-graduação de médicos, farmacêuticos, dentistas e veterinários até o término ou a interrupção do curso. (...)
Ditas alterações legislativas passaram a prever a hipótese de adiamento da incorporação até o final do curso de Residência Médica, o que antes não era admitido.
No caso dos autos, o autor anexou à inicial, em OUT9, atestado do HCPA informando que foi aprovado no Concurso de Seleção de Residência Médica, com início das aulas no dia 06/03/2014 e com término previsto para 28/02/2017, estando, portanto, atendidas as determinações do art. 29, 'e' da Lei n° 4.375/64 e art. 4º da Lei 5.292/67, ambos os dispositivos com a redação dada pela Lei n° 12.336/10.
Assiste razão ao autor, portanto. Cito nesse sentido:
EMENTA: ADMINISTRATIVO. SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO. ADIAMENTO PARA A REALIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA MÉDICA. POSSIBILIDADE. Sendo a residência médica uma extensão da formação regular do profissional médico, não é razoável impor a quem já obteve o adiamento da prestação do serviço militar durante o período do curso de medicina, que interrompa a sua residência para prestar o serviço militar obrigatório. O adiamento do início da prestação do serviço militar, para período imediatamente após a conclusão da residência, não trará prejuízo à União. (TRF4 5002355-03.2011.404.7100, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Vilson Darós, D.E. 31/08/2011)
EMENTA: ADMINISTRATIVO. MÉDICO. ADIAMENTO DO SERVIÇO MILITAR. RESIDÊNCIA MÉDICA E DOUTORADO. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. PREQUESTIONAMENTO. . É possível o adiamento da convocação para o serviço militar obrigatório para a conclusão da residência Médica em Neurologia e Doutorado em Ciência Médicas. Precedentes do Tribunal. . Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir. . Apelação e remessa oficial improvidas. (TRF4, APELREEX 5000713-29.2010.404.7100, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Silvia Goraieb, D.E. 02/12/2010)
De outra banda, encontra-se presente o requisito da urgência, porquanto a incorporação à vida militar, designada para o dia 06/03/2014 (evento 1, OUT5), poderá acarretar lesões irreparáveis à vida pessoal e profissional do autor.
O adiamento da incorporação, a fim de que sejam respeitados os ditames legais, deverá perdurar apenas até o final do Curso de Residência Médica.
Ante o exposto, defiro o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, para determinar à União Federal que suspenda a convocação do autor para prestação do serviço militar até o término do Curso de Residência Médica na área de Anestesiologia, junto ao Hospital de Clínicas de Porto Alegre, bem como para suspender a obrigatoriedade de apresentação para incorporação no dia 06 de março de 2014.
Não verifico motivos para alterar o entendimento dado por ocasião da liminar, de modo que adoto também os fundamentos supra aduzidos como razões de decidir desta sentença.
A procedência da demanda é, portanto, medida que se impõe.
Ante o exposto, confirmo o pedido de antecipação de tutela e, no mérito, julgo procedente a demanda, para determinar à União que suspenda a convocação do autor para prestação do serviço militar até o término do Curso de Residência Médica na área de Anestesiologia, junto ao Hospital de Clínicas de Porto Alegre, bem como para suspender a obrigatoriedade de apresentação para incorporação no dia 06 de março de 2014.
Condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo, no valor de R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais), com base no art. 20, § 4º do CPC.
Sentença sujeita a reexame necessário.
Havendo recurso(s) voluntário(s) tempestivo(s) e devidamente preparado(s) (salvo AJG ou isenção), tenha(m)-se por recebido(s) no efeito devolutivo.
Intime(m)-se a(s) parte(s) contrária(s) para apresentação de contrarrazões, no prazo legal. Após, remetam-se ao Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Publique-se. Intimem-se.
Com o trânsito em julgado e nada sendo requerido, dê-se baixa e arquivem-se os autos.
Porto Alegre, 12 de maio de 2014.
ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Juiz Federal Titular
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