Mais uma decisão judicial contra a discriminação por idade dos militares temporários

Oficial Temporária de Bagé licenciada por atingir limite de idade fixada em Portaria foi reintegrada.

Recurso da União Federal contra liminar concedida não foi provido.

O Julgamento do recurso da União foi realizado em 01/06/2011 pela 3ª Turma do TRF4.

LEIA A INTEGRA DA DECISÃO:



Agravo de Instrumento Nº 5000835-65.2011.404.0000/RS
 
A decisão agravada foi proferida nos seguintes termos:
Trata-se de ação ordinária, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, mediante a qual a autora, Nair Francinia Lucas Sena, Oficial Técnico Temporário do Exército, no cargo de Nutricionista, vinculada ao Hospital Militar da Guarnição de Bagé, pretende seja concedida a prorrogação do seu tempo de serviço por um período de 12 (doze) meses, a contar de 28 de fevereiro de 2001.
Afirma que está por completar 07 (sete) anos de tempo de serviço, tendo a sua última prorrogação vigência até 27/02/2011. Referiu que ao Oficial Temporário poderão ser concedidas prorrogações de tempo de serviço de 12 em 12 meses, até o limite máximo de 08 (oito) anos, conforme a Portaria Ministerial nº 528/10, do Comandante do Exército. Assevera que, no entanto, seu pedido de prorrogação por um prazo de mais 12 (doze) meses foi negado, com base no artigo 161 da Portaria Ministerial nº 251-DGP, de 11/11/2009. Fundamenta o seu pedido essencialmente no princípio da reserva legal.
É o breve relato. Decido.
O art. 273, I, do CPC exige, como pressupostos para a concessão da tutela antecipada, a prova inequívoca da verossimilhança das alegações e o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação quanto ao direito invocado.
Na presente hipótese, em um juízo de cognição sumária, a autora convenceu-me da verossimilhança das suas alegações.
Com efeito, consoante se denota do BI do Exército Nr 206, de 10/11/2010 (documento OUT7, anexo à inicial), a Autoridade Militar competente indeferiu o pedido de prorrogação de tempo de serviço formulado pela autora porque ele 'contraria o previsto no Parágrafo Único do Art 161, da Portaria Nr 251-DGP, de 11 Nov 09 (NT 13-DSM)', que assim dispõe:
Art. 161. Não será concedida prorrogação aos militares temporários:
I - oriundos do EIPOT das Armas, do QMB e do Serviço de Intendência que atingirem 34 (trinta e quatro) anos de idade;
II - oriundos do EIS, do EICEM ou do EST que atingirem 43 (quarenta e três) anos de idade;
III - oriundos do EBST que atingirem 39 (trinta e nove) anos de idade; e
IV - que não preencherem todas as condições exigidas.
Parágrafo único. A idade considerada não poderá ser atingida durante o período da respectiva prorrogação.
Ocorre que o fundamento invocado pela Autoridade se trata de ato administrativo normativo, que não se encontra imune ao controle exercido pelo Poder Judiciário sobre eventuais ilegalidades constantes em seu bojo.
E, no presente caso, tenho que o critério da limitação de idade adotada padece de ilegalidade.
Segundo disposições do art. 142, § 3º, inciso X, da Constituição da República, a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra.Assim, em razão da especificidade da carreira militar, a jurisprudência tem admitido que se fixem limites de idade para o ingresso nas Forças Armadas, desde que estes limites venham previstos em legislação específica e se justifiquem pelas peculiaridades do cargo.
Todavia, no caso em apreço, não existe lei que disponha acerca do limite de idade para a prorrogação do serviço militar temporário. Desta forma, as instruções específicas que trazem dita limitação, por serem atos normativos secundários, extrapolaram seus limites ao abordar matéria afeta a atos normativos primários.
Ademais, não se mostra razoável a limitação etária, conquanto não guarde qualquer relação com as atribuições do cargo exercido pela autora. No caso, a idade limite de 43 anos não se mostra justificável face às atribuições de nutricionista.Assim, carece de legalidade o ato de indeferimento do pedido de prorrogação do serviço militar temporário.
Isto porque os motivos que fundamentam a prática de determinado ato constituem supedâneos de sua própria validade, mesmo quando a motivação é exarada em relação a ato discricionário. É a teoria dos motivos determinantes. Nesse sentido:
RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. MILITAR TEMPORÁRIO. LICENCIAMENTO. ATO DISCRICIONÁRIO. RAZÕES. TEORIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES.VINCULAÇÃO. VÍCIO. ANULAÇÃO. MOLÉSTIA. INCAPACIDADE DEFINITIVA.REFORMA EX OFFICIO.
I - Apesar de o ato de licenciamento de militar temporário se sujeitar à discricionariedade da Administração, é possível a sua anulação quando o motivo que o consubstancia está eivado de vício. A vinculação do ato discricionário às suas razões baseia-se na Teoria dos Motivos Determinantes.
II - É incapaz definitivamente para o serviço ativo das Forças Armadas, para efeitos de reforma ex officio (art. 106, II, da Lei nº 6.880/80), o militar que é portador de síndrome definida no art. 1º, inciso I, alínea 'c', da Lei nº 7.670/88.
Recurso conhecido e desprovido.
(REsp 725.537/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 19.05.2005, DJ 01.07.2005 p. 621)
Percebe-se, desse modo, que, ao menos em análise perfunctória, a legislação não estabelece o limite de idade para a prorrogação do tempo de serviço de Oficial Temporário, sendo ilegal, portanto, o ato administrativo vinculado à limitação contida no regulamento - art. 161 da Portaria nº 251-DGP, de 11 de novembro de 2009.
Finalmente, o perigo de dano irreparável, como segundo requisito indispensável ao deferimento da medida, reside no fato de que a autora está prestes a ser licenciada, o que traria conseqüências importantes, em face do caráter alimentar que os vencimentos possuem.
Ante o exposto, defiro o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, para determinar à União que afaste a limitação etária em comento e se abstenha de efetuar o licenciamento da autora.
Intime-se a parte-autora da presente decisão e para que apresente comprovante de rendimentos, a fim de se analisar o pedido de concessão do benefício da Assistência Judiciária Gratuita.
Cite-se e intime-se a União.
Cumpra-se.'


Quando da análise do pedido de efeito suspensivo, proferi a seguinte decisão:

Inicialmente, cumpre aclarar, as novas regras insertas nos artigos 522 a 527 do Código de Processo Civil, dada a edição da Lei nº 11.187, de 19-10-2005, reserva o agravo de instrumento para impugnar decisão que inadmite a apelação, ou quanto aos efeitos do seu recebimento, bem como para impugnação de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação.
No presente caso, constata-se que a decisão agravada não é suscetível de causar lesão grave e de difícil reparação ao agravante.

Ademais, está em consonância com precedentes deste Tribunal Regional Federal que segue a teoria dos motivos determinantes do ato administrativos, ou seja, o ato administrativo discricionário, embora prescinda de motivo, está vinculado aos motivos que o fundamentam.

Isto posto, indefiro o pedido de efeito suspensivo.'


Não vejo razões para alterar o entendimento inicial, cuja fundamentação integro ao voto.

Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento ao agravo de instrumento.








Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Relator


Julgado pela 3ª Turma do TRF4 em 01/06/2011

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