Mais um militar que teve isenção tributária negada pelo Exército obteve vitória judicial

AÇÃO ORDINÁRIA (PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO) Nº 5037076-10.2013.404.7100/RS

AUTOR: JOCELY JOSE BOGONI
ADVOGADO : MAURÍCIO MICHAELSEN
RÉU : UNIÃO - FAZENDA NACIONAL



SENTENÇA


1. RELATÓRIO:

Trata-se de ação ordinária, com pedido de antecipação de tutela, em que a parte autora postula o reconhecimento do direito à isenção do imposto de renda (art. 6º, XIV, da Lei n.º 7.713/88), incidente sobre os proventos de reserva remunerada que percebe, bem como a repetição do indébito. Afirmou que, em junho de 2012, foi diagnosticada a doença. Disse que foi submetido à intervenção cirúrgica no mesmo ano e, posteriormente, requereu sua transferência para a reserva remunerada. Requereu o benefício fiscal administrativamente em fevereiro de 2013, mas foi informado de que seu requerimento não seria processado por não se tratar de reforma. Sustentou o demandante, no entanto, faz jus ao benefício fiscal, com base no inciso XIV do art. 6º da Lei n.º 7.713/88.

Foi determinada a realização de perícia (evento 3).

A parte autora recolheu as custas (evento 12).

A União contestou o feito (evento 16). Sustentou a ausência de laudo pericial emitido por serviço médico oficial. Alegou que os documentos médicos juntados não servem à comprovação da moléstia ensejadora da isenção.

Foi realizada a perícia e juntado o laudo (evento 34).

Intimados, apenas a parte autora peticionou.

Foi determinada a conclusão dos autos para sentença.

2. FUNDAMENTAÇÃO:

A isenção por doença - no caso, neoplasia maligna - encontra-se estabelecida no artigo 6º da Lei nº 7.713/88, verbis:

Art. 6º. Ficam isentos do Imposto sobre a Renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas:

(...)

XIV - os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma; (grifei)

Já a Lei nº 9.250/95 assim dispõe:

Art. 30. A partir de 1º de janeiro de 1996, para efeito do reconhecimento de novas isenções de que tratam os incisos XIV e XXI do art. 6º da Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, com a redação dada pelo art. 47 da Lei nº 8.541, de 23 de dezembro de 1992, a moléstia deverá ser comprovada mediante laudo pericial emitido por serviço médico oficial, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

1º O serviço médico oficial fixará o prazo de validade do laudo pericial, no caso de moléstias passíveis de controle.

2º Na relação das moléstias a que se refere o inciso XIV do art. 6º da Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, com a redação dada pelo art. 47 da Lei nº 8.541, de 23 de dezembro de 1992, fica incluída a fibrose cística (mucoviscidose).

Cabe destacar que a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região reconhece o direito à isenção nos casos de reserva remunerada, conforme se observa dos arestos abaixo transcritos:

IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. ISENÇÃO. ART. 6º, XIV, DA LEI 7.713/1988. MILITAR. RESERVA REMUNERADA. CARDIOPATIA GRAVE. O fato de a lei não prever expressamente a reserva remunerada no art. 6º, inciso XIV, da Lei nº 7.713, de 1988, não obsta à isenção do imposto de renda, visto que a cardiopatia grave, além de gerar isenção do imposto de renda, é motivo para a reforma ex officio, o que torna irrelevante a natureza dos proventos. (TRF4, APELREEX 5000367-78.2010.404.7100, Segunda Turma, Relator p/ Acórdão Rômulo Pizzolatti, D.E. 12/06/2013)17:43

IMPOSTO DE RENDA. PRESCRIÇÃO. LC Nº 118/2005. PROVENTOS DE APOSENTADORIA. SERVIDOR MILITAR. RESERVA REMUNERADA. CÂNCER DE PRÓSTATA. ISENÇÃO. LEIS Nº 7.713/1988 E Nº 8.541/1992. 1. No caso dos autos, não há falar em prescrição, já que a ação foi ajuizada 6/6/2006 e o autor pretende a isenção desde 08/2005. 2. A lei assegura a isenção total de imposto de renda a quem for acometido de neoplasia maligna (Lei nº 7.713, de 1998, art. 6º, XIV, com redação dada pela Lei nº 8.541, de 1992), o que no caso restou comprovado pelos documentos acostados aos autos e pela perícia realizada pela Junta de Inspeção Médica do Exército realizada. 3. A inativação dos servidores militares por motivo de saúde se dá através da reforma, razão pela qual a norma isentiva só faz referência a proventos da reforma e não a proventos da reserva remunerada. Estando o militar na reserva remunerada e verificando-se, por junta médica, que ele padece de uma daquelas moléstias incapacitantes, a isenção deve ser aplicada desde o momento em que se manifestou essa moléstia, porque desde então deveria ter ele sido reformado. A interpretação da norma isentiva é finalística, devendo considerar a situação fática em que se impunha a reforma ex officio (realidade material) ao invés do ato administrativo de reforma do militar (realidade formal). 4. A Lei prescreve ser indispensável a realização de perícia médica oficial para a obtenção do benefício fiscal. 5. A mens legis da isenção é não sacrificar o contribuinte que padece de moléstia grave e que gasta demasiadamente com o tratamento. 6. Os elementos dos autos são convincentes acerca da existência da doença e do termo inicial do acometimento. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 2006.71.00.019403-2, 2ª Turma, Juiza Federal MARCIANE BONZANINI, POR UNANIMIDADE, D.E. 15/01/2009).

No caso, o laudo pericial referiu que a neoplasia maligna foi diagnosticada em agosto de 2012. A parte autora sofreu tratamento definitivo por procedimento cirúrgico em 10/10/2012, quando realizada a prostatectomia total, encontrando-se o demandante em remissão clínica completa desde a cirurgia.
Transcrevo, a seguir, as principais respostas aos quesitos do juízo:

II. Quesitos do Juizo:
a) O autor é portador de neoplasia maligna?
Sim.

b) Qual a data do diagnóstico da doença? Há documentos indicando a data em que foi diagnosticada a doença? Se não, é possível definir um marco inicial? O tratamento é definitivo e temporário ou permanente?
A data do diagnóstico é 15.08.2012, data da biópsia prostática. Sim, há documentos (Evento 1 - Laudo13).

c) O autor sofreu procedimento cirúrgico ou tratamento médico? Quando foi encerrado o tratamento? Se não cessou o tratamento, há previsão de cessação?
Sim.

O autor foi submetido a prostatectomia total em 10.10.2012.
O tratamento cessou.

d) O autor pode se considerar curado? Se sim, desde quando? Se não, há previsão de cura para a sua situação concreta? Qual o período de tempo que se pode dizer que o autor foi portador da doença?
Não. O autor está em remissão clinica completa desde a cirurgia.

Há previsão de cura.
O autor deve ficar em controle clinico e laboratorial por 10 anos.

e) Qual o tipo de controle a que deverá se submeter? O que implica esse controle e por quanto tempo deve durar? Qual a periodicidade de exames?
O autor deverá se submeter a exame clinico e laboratorial por 10 anos. A periodicidade inicialmente é mensal, depois passa para trimestral e semestral do 5º ao 10º ano.

f) Esse controle implica medicação permanente?
Não.

g) Caso haja necessidade de controle da doença, indique o Sr. Perito o prazo de validade do laudo pericial, consoante dispõe o art. 5º , §5º, daInstrução Normativa da Receita Federal nº 15, de fevereiro de 2001. Em outras palavras, deverá o perito indicar o prazo mínimo presumível sob o qual o contribuinte deverá se sujeitar ao controle da enfermidade.
O prazo mínimo presumível é de 5 anos.

Embora o tratamento tenha sido exitoso, tem-se entendido que o benefício da isenção não exige a presença dos sintomas, a incapacidade ou a internação hospitalar. No caso dos autos, o perito esclareceu que a parte autora necessita de controle periódico mensal (gradualmente sendo modificado para trimestral e anual), além do que é inegável que tal procedimento acarretou a modificação de seu cotidiano, razão por que tem direito à isenção do imposto de renda sobre os seus proventos. Nesse sentido:

TRIBUTÁRIO. ISENÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA SOBRE PROVENTOS DE APOSENTADORIA. NEOPLASIA MALIGNA. DEMONSTRAÇÃO DA CONTEMPORANEIDADE DOS SINTOMAS. DESNECESSIDADE. 1. A disposição do art. 111 do CTN no sentido de que deve ser interpretada literalmente a legislação que trate acerca da outorga de isenção, não afasta o direito do autor, pelo contrário, interpretando-se literalmente o art. 6°, inciso XIV, da Lei n° 7.713/88, verifica-se que a lei tão-somente exige o diagnóstico das doenças ali elencadas para a concessão da isenção de imposto de renda, não exigindo a presença de sintomas, a incapacidade total ou a internação hospitalar para o deferimento ou manutenção da isenção. 2. Embora a perícia tenha atestado que a parte autora atualmente não sofre de neoplasia maligna, o fato é que a doença e o respectivo tratamento deixaram sequelas e alteraram de modo definitivo o cotidiano do autor. Além disso, pacientes com tal histórico devem receber acompanhamento médico periódico, a fim de evitar e prever reincidências. Assim, o conceito de tecnicamente curado deve ser recebido cum granu salis quando se cuida de averiguar a possibilidade de aplicação do beneficio fiscal em testilha. (TRF4, APELREEX 5015254-33.2011.404.7100, Primeira Turma, Relator p/ Acórdão Jorge Antonio Maurique, D.E. 01/08/2013)

A apuração do valor do imposto de renda a ser restituído deverá considerar as informações contidas nas declarações de ajuste relativas aos períodos objeto de restituição, considerando os valores já restituídos e o sistema de deduções permitido, simulando-se as declarações retificadoras, consoante pacífico entendimento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, atualizando-se o tributo pela taxa SELIC.

Por fim, presente a verossimilhança da alegação fundada no juízo de procedência do pedido, e considerando que a parte não deve ser obrigada ao pagamento de tributo indevido para que venha obter a restituição, decido conceder a tutela antecipada para suspender a exigibilidade do imposto de renda sobre os proventos do autora.

Oficie-se à fonte pagadora para que deposite judicialmente o imposto de renda descontado do autor em conta judicial vinculada a este processo.

3. DISPOSITIVO

Ante o exposto, concedo a tutela antecipada e julgo procedente o pedido para declarar o direito do autor à isenção do imposto de renda sobre seus proventos de reserva remunerada desde agosto de 2012, condenando a União a proceder à restituição do tributo indevidamente pago, nos termos supramencionados, extinguindo o processo com a resolução do mérito, nos termos do art. 269, I, do CPC.

Condeno a União na restituição das custas e honorários periciais, atualizados pelo IPCA-E desde o pagamento, bem como em honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação.

Eventuais apelações interpostas pelas partes restarão recebidas no efeito devolutivo, salvo nas hipóteses de intempestividade e, se for o caso, ausência de preparo, as quais serão oportunamente certificadas pela Secretaria.

Interposto(s) o(s) recurso(s), intime(m)-se a(s) parte(s) contrária(s) para apresentação de contra-razões. Decorrido os respectivos prazos, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Oficie-se à fonte pagadora, considerando a tutela que foi antecipada.

Transitada em julgado sem modificações, expeça-se alvará em favor do autor para o levantamento dos depósitos efetuados.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Porto Alegre, 26 de novembro de 2013.

Alexandre Rossato da Silva Avila
Juiz Federal

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