Militar portador de HIV deve ser reformado. Negativa da administração militar gera dano moral.

Jurisprudência

STJ

Reforma Militar - Militar portador HIV - Grau imediato superior - Danos Morais


"A União, com fundamento no artigo 105, III, "a", da Constituição Federal, interpôs recurso especial contra acórdão do Tribunal Federal da 4ª Região assim ementado:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MILITAR. HIV-AIDS. REFORMA. DANOS MORAIS.
1. Diante da condição sorológica positiva (HIV-AIDS) da parte autora, faz jus o militar à reforma, com remuneração correspondente ao grau hierárquico imediatamente superior.
2. A lesão à integridade física e psíquica, decorrente da negativa ilegal à reforma militar, enseja indenização por danos morais, mesmo porque o desligamento irregular potencializa as consequências do preconceito e do estigma associados ao vírus HIV.
3. Apelo provido (fl. 269).

(...)
Aduz "a inadmissibilidade de postulação de indenização por danos verificadas em relação estatutária (militar) [...], pois a responsabilidade estabelecida no art. 37, 6º, da Constituição é da União em relação a terceiros atingidos por atos praticados por seus agentes" (fl. 308).

Afirma não ter se desincumbido o autor do ônus de demonstrar a existência de dano moral a justificar a condenação da União em indenizar, tampouco foram preenchidos os requisitos atinentes à responsabilidade civil e ao nexo de causalidade (310).

Assevera que o demandante, militar temporário, não tem direito à estabilidade, sendo que a prorrogação do tempo de serviço militar fica submetida a critério de conveniência do Comando Militar (fl. 309).

Diz que "a exclusão do autor foi procedida em pleno atendimento à legislação militar" (fl. 313).

É o relatório.

(...)

O Tribunal a quo, entendeu que, não obstante a inexistência de previsão de tal indenização no Estatuto dos Militares, o regime de direitos fundamentais, elencados art. 5º da Constituição Federal, ampara o direito à indenização sempre que atingida a integridade física ou psíquica da pessoa, o que no caso decorreu "em face das consequências e do preconceito, estigma e exclusão associados ao vírus HIV" (fl. 266).

Desse modo, ao decidir essa questão, o Tribunal de origem adotou fundamento exclusivamente constitucional, o que inviabiliza o conhecimento do recurso especial nesse aspecto. Nesse sentido:

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. LIMITE DE IDADE. CONCURSO PÚBLICO. MILITAR. ACÓRDÃO COM FUNDAMENTO PURAMENTE CONSTITUCIONAL. RECURSO ESPECIAL. INADMISSIBILIDADE.
1- Estando o acórdão fundamentado essencialmente em preceitos da carta magna, descabe a análise de recurso especial, sob pena de usurpação da competência do STF.
2- Agravo regimental a que se nega provimento (AgRg no REsp 1104969/RS, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em 2/4/2009, DJe 27/4/2009).

Com relação à questão de fundo, o acórdão recorrido, com amparo nas provas contidas no processado, concluiu que o recorrido adquiriu o vírus HIV durante o período de prestação do serviço militar, o que lhe garante o direito de ser reformado por incapacidade definitiva.

Assim, não merece reforma a decisão, uma vez que se afina com a jurisprudência desta Corte Superior, que considera incapaz definitivamente para o serviço militar o portador do vírus da Aids, em conformidade com o artigo 1º, I, "c", da Lei n. 7.670/1988, ainda que assintomático.

Nesse sentido é a redação legal, in verbis :

Art. 1º A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida - SIDA/AIDS fica considerada, para os efeitos legais, causa que justifica:
I - a concessão de:
(...);
c) reforma militar, na forma do disposto no art. 108, inciso
V, da Lei nº 6.880, de 9 de dezembro de 1980;

Anotem-se, ainda:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO. MILITAR. INCAPACIDADE DEFINITIVA. REFORMA EX OFFICIO. DESENVOLVIMENTO DA DOENÇA. PORTADOR ASSINTOMÁTICO. DISTINÇÃO NÃO DELINEADA PELO LEGISLADOR. REMUNERAÇÃO. SOLDO CORRESPONDENTE AO GRAU HIERÁRQUICO IMEDIATO AO QUE POSSUÍA NA ATIVA.
I É incapaz definitivamente para o serviço ativo das Forças Armadas, para efeitos de reforma ex officio (art. 106, II, da Lei nº 6.880/80), o militar que é portador de síndrome definida no art. 1º, inciso I, alínea "c", da Lei nº 7.670/88. Precedente.
II - A reforma ex officio de militar, baseada nos arts. 106, II, 108, V, e 109, da Lei nº 6.880/80 e art. 1º, inciso I, alínea "c", da Lei nº 7.670/88, não comporta discussão acerca do desenvolvimento da doença, mesmo que o portador seja assintomático, pois tal distinção não foi delineada pelo legislador. Precedente.
III - O militar reformado ex offício com base no art. 110, 1º, da Lei nº 6.880/80, tem direito à remuneração calculada com base no soldo correspondente ao grau hierárquico imediato ao que o autor possuía na ativa.
Agravo regimental desprovido (AgRg no Ag 915.540/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 28/2/2008, DJe 22/4/2008 - grifou-se).

RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO. OFENSA A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. ANÁLISE. VIA ELEITA. IMPOSSIBILIDADE. AFRONTA AO ART. 535 DO CPC. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. QUESTÕES NÃO IDENTIFICADAS NAS RAZÕES. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA Nº 284/STF. ÔNUS DA PROVA. DECLARAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE DO AUTOR. MATÉRIA NÃO DEBATIDA PELA E. CORTE DE ORIGEM. SÚMULA Nº 211/STJ. MILITAR TEMPORÁRIO. LICENCIAMENTO. ANULAÇÃO. PORTADOR DE SÍNDROME DEFINITIVAMENTE INCAPACIDADE. REFORMA EX OFFICIO. DESENVOLVIMENTO DA DOENÇA. PORTADOR ASSINTOMÁTICO. DISTINÇÃO NÃO DELINEADA PELO LEGISLADOR. IMPOSSIBILIDADE TOTAL E PERMANENTEMENTE PARA QUALQUER TRABALHO. REMUNERAÇÃO. SOLDO CORRESPONDENTE AO GRAU HIERÁRQUICO IMEDIATO AO QUE POSSUÍA NA ATIVA.
I As violações a dispositivos constitucionais não podem ser objeto de recurso especial, porquanto matéria própria de apelo extraordinário para a Augusta Corte.
II - Configura deficiência na fundamentação do recurso especial a alegação de que houve ofensa ao art. 535, II, do CPC, sem a identificação das questões que deixaram de ser apreciadas, em sede de embargos de declaração, pelo e. Tribunal a quo, devendo ser aplicada à hipótese o enunciado da Súmula nº 284 do Pretório Excelso.
III - A questão referente ao ônus do autor produzir prova contrária à declaração da Administração - que considerou ausente a incapacidade do autor - não deve ultrapassar o juízo de admissibilidade, uma vez que não foi objeto de debate no e. Tribunal a quo, ressentindo-se o recurso do necessário prequestionamento, segundo dicção da Súmula nº 211 do STJ.
IV - É incapaz definitivamente para o serviço ativo das Forças Armadas, para efeitos de reforma ex officio (art. 106, II, da Lei nº 6.880/80), o militar que é portador de síndrome definida no art. 1º, inciso I, alínea "c", da Lei nº 7.670/88. Precedente.
V A reforma ex officio de militar, baseada nos arts. 106, II, 108, V, e 109, da Lei nº 6.880/80 e art. 1º, inciso I, alínea "c", da Lei nº 7.670/88, não comporta discussão acerca do desenvolvimento da doença, mesmo que o portador seja assintomático, pois tal distinção não foi delineada pelo legislador. Precedente.
VI Caracterizada a impossibilidade total e permanentemente para qualquer trabalho, o militar reformado ex offício com base no art. 110, 1º, da Lei nº 6.880/80, tem direito à remuneração calculada com base no soldo correspondente ao grau hierárquico imediato ao que o autor possuía na ativa.
Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido (REsp 714.339/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 7/6/2005, DJ 1º/8/2005 p. 544).

(...)

Ante o exposto, nos termos do art. 557, caput, do Código de Processo Civil, nega-se seguimento ao recurso especial.

Publique-se e intimem-se.

Brasília (DF), 27 de outubro de 2010. (...)


RECURSO ESPECIAL Nº 1.182.976 - RS (2010/0034698-5)

RELATOR : MINISTRO JORGE MUSSI

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